20 março 2007

O Sr. que me diz Adeus....


O Sr. que me diz Adeus.
Quem é que não o conhece?
Quem é que já não o viu na Fontes Pereira de Melo, Saldanha ou Restelo?
Considero-o um mito urbano, aquele que mais me fascina... é como uma versão contemporânea do Velho do Restelo de Camões.
A sua figura intriga-me, como posso resistir àquele aceno contagiante, ao sorriso ternurento e ao olhar de partir o coração.
Sempre que passo por ele não me contenho. Busco-o incessantemente com o olhar. Adoro vê-lo!...abro frenéticamente a janela do carro, coloco o braço de fora, sorri-o e cumprimento-o como se o conhecesse. É o Sr. que me diz Adeus. Sinto uma vontade avassaladora e parar o carro no meio da estrada e ir falar com ele.
É o Sr. que independente daquilo que esteja a acontecer na minha vida, está lá, com um Adeus!
De porte aristocrático, envergando uma camisola de gola alta escura e um fato clássico, cabelo ondulado grisalho minunciosamente penteado repleto de gel, sorriso nos lábios, óculos de massa preta que escondem a sua história. Hoje quis conhece-la. Pesquisei na net e encontrei.
Assim, àquele que me dá alento, me emociona, me alegra, que tanto me dá, sem nem sequer o imaginar e nada me pede em troca, esta é a minha homenagem. Esta é a tua história.

"Tudo começou há três anos e meio, depois da morte da mãe, com quem vivia. João Paulo Serra, de então 69 anos, precisava de se distrair, incomodava-o a ideia de estar sozinho em casa. Um dia, aconteceu.
Já reparara que as pessoas o cumprimentavam sem razão, nos centros comerciais e, sem saber como nem porquê, surgiu o primeiro aceno na estrada. Depois veio outro e outro, e o acaso virou fenómeno. «No início era só rapaziada nova, mas depois contagiei todo o tipo de gente», explica sem esconder um certo orgulho.
Graças ao seu «milagre», já deu entrevistas para a televisão e para os jornais, apareceu em dois filmes e até num teledisco. «Sempre quis ser actor, mas nunca me deixaram...». Ou nunca teve coragem de tentar. Algumas dezenas de acenos mais tarde, já não são um João risonho e despreocupado, «com imensos amigos» com quem vai «ao teatro e ao cinema», que fala por detrás dos óculos de massa negra.Nos olhos cinzentos, estão duas lágrimas contidas. Pelo passado, pelo presente e por um futuro que não chega.
Com um raciocínio de fazer inveja aos mais novos, o louco, o excêntrico, transforma-se lentamente num avô contador de histórias, que lê Agatha Christie para combater o medo ao andar de avião, que não tem telemóvel porque detesta máquinas.
Nasceu no seio de uma família muito rica. Até aos dez anos, viveu num enorme palacete do Tomás Ribeiro, cobiçado mesmo pelo próprio Gulbenkian. «Que saudades tenho desse tempo... A casa estava sempre cheia de família e amigos...». Mimado desde bebé, fez a instrução primária toda em casa, com um professor particular, pois no primeiro dia de aulas no Colégio Parisiense chorou tanto, que os pais não tiveram coragem de o mandar de volta. «Fui criado numa redoma de vidro», confessa, explicando: «Naquela época era tudo muito diferente, havia muitos tabus.» Depois do divórcio dos seus progenitores, quando tinha 13 anos, João foi morar para o Restelo com o pai. Por ele, inscreveu-se em Direito, mas depressa desistiu, «era muito chato».Depois de uma igualmente curta passagem pelo curso de Histórico-Filosóficas, o pai, «que não sabia o que fazer» com ele, mandou-o para Londres, com o irmão.«Foram três anos fantásticos. Tinha um grupo de amigos fabuloso, com quem viajei imenso. Teria lá ficado, se não fosse tão agarrado à família...» Sem quase pôr os pés nas aulas, regressou a Portugal e, depois da morte do pai, pouco tempo depois, foi morar com a mãe, de quem não se separou até ao último dia da sua vida. «Viajámos muito os dois. Todos os anos íamos a Paris e Madrid. Conheço a Europa inteira, excepto a Grécia...» E o olhar perde-se num momento só dele, como se pensasse alto. Quando a mãe morreu, «ficou desasado». E talvez por isso esteja todas as noites a «comunicar». Admite que o que faz «não é muito normal», mas não passa sem isso. É o remédio que lhe permite disfarçar a solidão que o consome e o faz olhar para o passado com arrependimento, por não ter ousado viver a sua vida em vez da dos outros. «Às vezes penso que foi tudo inútil...».
No baú dos sonhos perdidos, jaz o curso que não tirou, o trabalho que nunca fez, os filhos que não teve e, pior, o grande amor que nunca conheceu.«Sinto-me só. Incompleto. Como se algo estivesse a falhar.» E assim lacrimeja quando vê um casal idoso de mãos dadas, ou quando dois rapazes, que diz «reconhecer do subconsciente», param o jipe para tirar uma fotografia com ele.
«Encontramo-nos no céu», repete..."
Agora, já te posso dizer. Olá.


Sem comentários: